quarta-feira, 6 de maio de 2020

Quando a vontade vence o receio

Podia ser um sábado qualquer, desses dias buenaços de sol, que o tempo consome de largo, pois tudo que é bom se vai rápido em nosso vil entender. Mas não, era um sábado de maio, gaúcho em quantia. E por gaúcho se parou. Mate ao amanhecer, tironeando o friozito do campo, ajeitar a bicharada pra que passem bem o dia, pois quem quer ter, tem que saber cuidar e se prestar pra isso. Aprendi com meu pai. Estradeando, na cruzada um beijo, um afago e o trato pro amanhã com os pequenos. Razão do nosso viver, presentes de Deus! E se chega no destino morredor do dia. Um assado bem gaúcho no restingal. Fogo de lenha buena, carne no espeto do jeito campeiro. Água da bica, do jeito antigo. Charla, causo, e bóia de fundamento. Arrebanhar a gadaria, oferecer um trato singelo. Abrir o peito chamando a cavalhada. Devagarito, a parceria vai se chegando. A pé, à cavalo, de camionete. Quando o sol “froxa o tento”, a encilha da matungada toma forma. Na falta de freio, de buçal mesmo. De laço nos tentos, ao passo devagarito, “se vamo”. Por manso e sujeito, estendemos o laço e se vamos arrastando, pra apertar o tento e trabalhar a trança. No mais, a fome da indiada ganha vaza, e começa a cantar portão. Por receio, apeio. Nessa de faltar freio, cambiamos cabeçada e rédea pelo buçal um do outro. A novata não sabe muita coisa, e fica com medo de lidar de corda. Como é negociação do patrão, faz bem quem auxilia e não se mete na conversa. Nessa cambiada, por falta de atenção, tá o cavalo pra dentro da pista. Monto de novo, com intenção de sair, e justo nessa hora refuga um osco, bem do meu lado. Eu que tava quieto, resignado. Firme na intenção de dar mais tempo pro retorno, sou pego de surpresa pelo inusitado da situação. Atraco o gateado, pra fazer o boi andar, e me pedem de imediato que leve pro fundo. Saio, e como cavalo bom sabe do serviço, vai acompanhando o tranco do boi. Primeiro galope depois de cerca de um ano. Tudo bem, tudo certo. Nessa mescla de desconfiança, vontade e fome de corda, faço a armada e no retorno, de bate pronto, saio cutucando o barroso com o bico da bota. É ponto! Chego no fundo, avalio. Tudo bem. Venho de volta, mais uma boa. Penso, avalio e entendo que é hora de ser prudente. Enrodilho o laço, apeio e encerro as atividades. Avalio com o patrão: De canhota, de buçal, e duas positivas. Tá valendo mais o gateado! Hehehe. Passa um tempo, vamos auxiliando no serviço de mangueira, até que o patrão retorna, agora de freio, e pede que pegue novamente. A vontade vence o receio. Mais quatro pegadas. Duas, uma e uma. Tá ótimo pra um retorno. Treino feito. Volta realizada. Tudo bem, tudo certo. Tudo nos conformes. Sem dor, sem desconforto. Uma ressalva para a montaria. É de fundamento. Cômodo, calmo, domado e meio. É pingo e pico! Pingo de lei, de valia e de valor. Corre lotes de bois e “malemal” bota suor na xerga. É montaria de patrão! Faz bem em recusar qualquer proposta. Um pingo, quando lhe serve pra qualquer circunstância, não tem preço que pague a serventia. Não por acaso, é gateado. Não por acaso, é cria dos TJ. É pêlo da tradição e marca de cavalo bueno! O rodeio que me aguarde! Vamo que vamo!

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